Gastronomia e Erotismo

Há duas necessidades vitais para a preservação tanto da espécie humana como a dos animais: alimentação e procriação. São instintos básicos para a sobrevivência. Qualquer animal, humano incluído, ao nascer precisa imediatamente se alimentar da maneira que lhe for mais conveniente, próxima, fácil e imediata. Igualmente há um momento na vida de todos os animais que o instinto de preservação da espécie os levam a acasalar-se.

A história do mundo nos conta que apenas os mais fortes, e os que tiveram melhores condições de vida sobreviveram. Sem falar das grandes hecatombes há uma seleção natural em todas as espécies.

O gênero humano sofisticou, desenvolveu, cultuou estes instintos, ao contrário dos animais, tornando-os fonte de prazer.

Desde tempos imemoriais o homem foi transformando o alimento, sejam vegetais e animais em comidas saborosas.

As mais diferentes culturas desenvolveram rituais de comportamento, verdadeiros códigos, alguns de ética estabelecendo padrões e regras de conduta.

Os banquetes romanos eram tão suntuosos, regados a vinhos e grandes comilanças proporcionando prazeres que se encaminhavam para verdadeiras orgias. A história nos descreve os festins romanos regados a muito vinho, música e danças que terminavam em grandes bacanais (alusão ao deus Baco).

O ato de comer, nos dois sentidos, tornou-se uma fonte inesgotável de prazer, de convivência, de beleza, de harmonia, de sofisticação levando à gastronomia e ao erotismo.

Igualmente o ato de transar, trepar, fazer amor, com ingredientes de sedução, de ambientação são uma fonte inesgotável de delícias.

Comida e sexo caminham juntos. Manjares delicados e situações erotizantes, disto é feita a vida.

Jorge Amado em seu livro Gabriela Cravo e Canela descreve os quitutes culinários preparados pela morena cor de canela e cheiro de cravo para seu Nacib seduzindo-o na mesa e na cama. Os quitutes que ela preparava com pimentas e ervas aromáticas seduziam o turco Nacib.

O ditado popular que diz que as mulheres conquistam  os homens pelo estomago, nada melhor que  Gabriela para comprovar. Acompanhar as artes de Sonia Braga na pele de Gabriela, com toda alegria da mulher livre, leve e solta nos leva a bons momentos de prazer.

Cozinhar é um ato de amor e cozinhar para quem se gosta é duplamente gratificante. É disto que a Galeria Degustar vai tratar para seus leitores, motivando-os a viver estes prazeres até o infinito.

Bebidas Eróticas

Bebidas afrodisíacas são infusões, decocções, fermentados ou destilados de partes de plantas empregada para aumentar o desejo e/ou o desempenho sexual, bem como a fertilidade. Em matéria de bebidas afrodisíacas, milenarmente conhecida como “elixir do amor”, o álcool impera absoluto, apesar da advertência de Porter, personagem do Macbeth de William Shakespeare:

O álcool provoca o desejo, mas impede o desempenho“.

Questão de dose, como diria o grande alquimista, Paracelso.

Com efeito, a maioria das bebidas relaxantes, como o álcool, na dose certa, ajuda a criar um clima propício para o que se deseja que ocorra a seguir.

Mesmo algumas bebidas tidas como afrodisíacas em si, como o absinto, derivado destilado da Artemisia vulgaris só o são devido ao álcool, não à pobre da artemísia, recada plantinha que adquiriu, injustamente, má fama e caiu na boca do povo. Literalmente.

Outra bebida tida, há séculos, como afrodisíaca é o chocolate feito a partir do cacau (Theobroma cacao). Diz a lenda que Montezuma cumpria um ritual de tomar infusões de chocolate antes do defloramento cerimonial de virgens. No inverno, um bom chocolate quente, reforçado com gema de ovo e uma dose de conhaque cai muito bem, antes ou depois.

Talvez nenhuma outra beberagem afrodisíaca tenha ocupado mais tanto a imaginação  popular quanto a literatura do que a mandrágora (Mandragora officinarum), planta de origem eurasiana, cuja raiz pode assemelhar-se a um do corpo humano. Durante a Idade Média o chá dessa raiz era tido como o verdadeiro elixir do amor.

A partir dessa crença, Niccolo Maquiavel escreveu, em 1518, uma deliciosa comédia em cinco atos chamada justamente “A Mandrágora“, na qual, um embusteiro apaixonado por uma mulher casada  que não conseguia engravidar, finge-se de médico e “prescreve-lhe” uma infusão de mandrágora, com a ajuda da qual atinge seu objetivo, para gáudio de ambos.

Também de outras regiões, contribuem para a farmacopéia e para o folclore das bebidas afrodisíacas, o gingko (Gingko biloba, China), o ginseng (Panax ginseng, América do Norte, China e Coréia), o gengibre (Zingiber officinale, Sudeste Asiático) e o abrolhos (Tribulus terrestris, Mediterrâneo).

Contudo, a flora brasileira tem destacados competidores no terreno das matérias primas de bebidas tidas como afrodisíacas, desde o inocente guaraná (Paullinia cupana) até a catuaba (Anemopaegma arvense), a marapuama (Ptychopetalum olacoides) e o nó-de-cachorro (Heteropterys tomentosa).

E a literatura nacional tem também um notável texto sobre uma prodigiosa beberagem afrodisíaca, “O Elixir do Pajé“, de Bernardo Guimarães, cuja receita, infelizmente não nos é revelada. Pena, pois

“Este elixir milagroso,
o maior mimo na terra,
em uma só gota encerra
quinze dias de tesão…
que só com uma estocada
põe a porta escancarada
do mais rebelde cabaço,
e pode em cento de fêmeas
foder de fio a pavio,

Comidas Afrodisíacas

Diz a sabedoria popular que “saco vazio não para em pé”. Essa é primeira regra da gastronomia afrodisíaca: melhor comer algo que nada. E, já que se vai comer, que seja algo saudável, saboroso e que agrade tanto quem come quanto Afrodite e seu filho Eros.

Há milênios, curandeiros, xamãs e médicos compilam listas de alimentos que se acredita que melhorem o apetite e/o o desempenho sexual, conforme a necessidade e o interesse (antigamente, esperava-se que o afrodisíaco aumentasse também a fertilidade).

Plínio e Dioscórides, já antes de Cristo abordaram esse assunto. Entre os alimentos tidos como afrodisíacos encontram- se itens assemelhados (quanto à forma, ao sabor ou ao odor) a órgãos genitais, como aspargos, ovos, tubérculos (ah, a mandrágora!), ostras, alho, figos, banana e incontáveis outros. A maioria desses alimentos destina-se a homens, mas há também indicações específicas para mulheres (WALTER).

Gertrude Stein disse que “Rosa é uma rosa é uma rosa é uma rosa ” Maçã é nome próprio, mas seria também uma maçã uma maçã uma maçã? Não consta que a maçã seja um alimento afrodisíaco, no sentido material do termo, mas será que Eva teria seduzido Adão sem uma apetitosa e suculenta maçã.

E não foi a maçã o pomo da discórdia para se decidir qual era a mais belas das deusas? Novamente, Afrodite, escolhida por Paris (entre as deusas do Olimpo, pois entre as mortais era Helena e, dessa confusão surgiu a Guerra de Troia, que nada teve de afrodisíaco).

Além dos ingredientes, química em si, a intenção e o ato de preparar o alimento afrodisíaco sempre teve algo de ritual, de propiciatório, de sortilégio. Ao ser-lhe pedida a receita de uma deliciosa perna de vitela assada, que vinha à mesa inteira num carrinho, o gordo italiano dono da cantina que a servia, puxou uma cadeira, sentou-se à mesa e começou a ensinar, com os olhos brilhando e a voz vibrando:

pego uma boa perna de vitela, coloco-a numa grande travessa, cubro de vinho, alho esmagado, cebolas picadas, todos os cheiros verdes um pouco de sal e fico massageando-a longamente, pensando nas coxas da mulher amada…

A perna de vitela não costa de listas de alimentos afrodisíacos, mas essa  receita, para a “mulher amada“, que estava ali ao lado, ouvindo a receita, e que era a responsável pelo forno e fogão nem seria preciso comer da vitela: o  sortilégio estava lançado.

Isabel Allende escreveu um livro encantador sobre alimentos, receitas, preparações, acompanhamentos e acompanhantes relacionados a Afrodite, cujo subtítulo sabiamente indica “Contos, receitas e outros afrodisíacos”, e cuja epígrafe, atribuída a um certo Kumaradadatta, do século XII, diz:

“Seu hálito é de mel com fragrância de cravo,
sua boca, deliciosa manga madura,
beijar sua pele é provar o lótus,
do fundo de seu umbigo rescendem especiarias.
O que vem depois, a língua sabe,
mas já não consegue falar.

Atribuído a (século XII)

Com a língua e outras partes nobres do corpo ocupadas, só nos resta misturar, aquecer, mexer bem e degustar. Bom proveito!

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